Daqui também trememos, com a chance de assumir os controles de um Benz Patent-Motorwagen, primeiro modelo de automóvel da História. Criado na Alemanha, por Karl Benz, o "veículo com motor a gás" foi patenteado em 29 de janeiro de 1886 e deu sua primeira volta pelas ruas de Mannheim seis meses depois.
Passados exatos 125 anos, vivemos uma educativa experiência de dirigir a máquina pioneira. Foi no estacionamento do Boulevard Shopping, em Belo Horizonte, onde está sendo realizada, até 21 de agosto, a exposição Clássicos sobre Rodas.
O carro que dirigimos pertence ao colecionador Leo Gouvêa e é praticamente zero-quilômetro. Explica-se: por duas vezes (primeiro em 1980 e depois em 2002), a Benz fabricou pequenas séries do Patent-Motorwagen seguindo estritamente os projetos iniciais do carro de 1886.
Com a mão direita, o mecânico dá um forte puxão para girar o enorme volante do motor. Uma tentativa, duas e, na terceira, o que se ouve é o som de um passado remoto despertando 125 anos depois. É uma batida ritmada e metálica, lembrando uma máquina de costura: "tchaf-tchaf-tchaf-tchaf...". Quase dá para contar suas rotações. Eixos e engrenagens giram expostos aos olhos dos presentes, que se sentem num livro de Júlio Verne. Mesmo estacionado, o carro treme como se fosse um ser vivo.
Não são réplicas, mas clones perfeitos, com números de série e feitos pelo mesmo fabricante do original. Os carros foram distribuídos a concessionárias Mercedes e alguns chegaram a colecionadores, pelo preço aproximado de US$ 60 mil.
De perto, o primeiro dos automóveis é muito elegante com suas três rodas raiadas. Pesa apenas 265 kg e é muito mais leve do que as monstruosas carruagens que eram adaptadas com motores a vapor no século XIX.
O motor de quatro tempos tem apenas um enorme cilindro, na horizontal. O volante do motor é gigantesco e também vai deitado. Não há cárter: a lubrificação é feita por meio de pequenos recipientes de óleo, que pingam (quatro gotas por minuto) sobre o virabrequim e o mecanismo das válvulas. Também não existe radiador: a água para refrigeração fica dentro de um grande cilindro de cobre, se evaporando aos poucos.
Na época não havia postos de gasolina e Karl Benz comprava na farmácia algum combustível que, misturado a ar, gerasse boa explosão — podia ser éter ou benzina. Não havia acelerador: por uma espécie de válvula montada perto do banco, o motorista acertava a mistura e uma faixa constante de rotação.
Importante notar que esse velho Benz já trazia, de forma elementar, todos os princípios dos motores de quatro tempos usados nos carros de hoje.
De cima do motor sai uma correia de couro que gira um eixo no meio do chassi. Desse eixo saem duas correntes (como as de moto) para as rodas.
Não há marchas, nem pedais de freio ou acelerador. Apenas uma alavanca do lado esquerdo do motorista: empurrada para a frente, ela estica a correia de couro e faz o motor tracionar o eixo — e o Patent-Motorwagen ganha velocidade. Puxada para trás, ela deixa o carro em ponto morto e freia. Ré não há, mas o Benz pode ser empurrado facilmente.
Vamos andar! "Tchaf-tchaf-tchaf..." e o Benz ganha velocidade com esforço. Tomado o embalo, vai muito bem — sua velocidade de cruzeiro é pouco maior que a de um maratonista... Só não exija do motor de 0,9 cv encarar uma subida. Por menos íngreme que seja a ladeira, o carro terá que ser empurrado.
Uma barra ligada a uma engrenagem vira a única roda da frente. A direção é levíssima, já que os pneus são fininhos e de borracha maciça. Molas macias no eixo traseiro e sob o banco ajudam no conforto. A uns 14 km/h, a brisa já refresca o motorista.
A maior surpresa é que dirigir o Benz de 1886 é muito mais simples do que conduzir um carro moderno. Foram 20 minutos de retas e "curvas radicais". Ao fim, um grande sorriso nos lábios e a dúvida: será que, no futuro, os veículos serão tão simples e inteligentes?
FICHA TÉCNICA - BENZ PATENT-MOTORWAGEN modelo 1886
ORIGEM: Alemanha
MOTOR: quatro tempos, um cilindro horizontal, refrigerado a água, 954 cm³, potência máxima de 0,9 cv (a 400 rpm)
TRANSMISSÃO: primária por correia e secundária por corrente. Tração traseira. Uma marcha à frente (sem ré)
SUSPENSÃO: dianteira, não existente. Traseira por molas elípticas
FREIOS: por correia de couro ligada ao eixo de transmissão
PNEUS: de borracha maciça
DIMENSÕES: comprimento: 2,70 m; largura: 1,40 m; altura: 1,45 m; entre-eixos: 1,45 m
PESO: 265 quilogramas
VELOCIDADE MÁXIMA: 16 km/h
Mulher ao volante
Bertha Benz e a primeira viagem de automóvel
Desde que o francês Nicolas-Joseph Cugnot fez um desajeitado trator militar movido a vapor, em 1769, muita gente tentou criar um automóvel prático.
Quem conseguiu foi o engenheiro alemão Karl Friedrich Benz (1844-1929). Desde 1871, ele trabalhava com fundições na cidade de Mannheim, no sudoeste da Alemanha.
Com a ajuda da bela esposa Bertha Benz (1849-1944), montou uma empresa para a construção de motores de combustão interna: primeiro de dois tempos e, finalmente, de quatro tempos. Os negócios, contudo, iam mal.
Entusiasta das bicicletas e dos motores, Benz acabou inventando o automóvel... Sua mente genial bolou um chassi tubular, um sistema de tração e pronto — nasceu o Patent-Motorwagen.
O curioso é que, a menos de 100 km de distância e sem o conhecimento de Benz, outro alemão também avançava na criação do automóvel. Era Gottlieb Daimler. Só em 1926 é que as empresas se uniriam, formando a Daimler-Benz.
O primeiro exemplar do Benz Patent-Motorwagen, de 1886, hoje está no Deutsches Museum, em Munique. Depois, vieram aperfeiçoamentos, até que as vendas ao público enfim começassem, em 1888.
Na primeira viagem de automóvel, iniciada em 5 de agosto de 1888, era Bertha Benz quem estava ao volante... Pela manhã, sem falar nada ao marido, ela pegou dois de seus filhos adolescentes e dirigiu até a casa da mãe.
Foi um passeio de 106 quilômetros dirigindo o terceiro exemplar do Patent-Motorwagen produzido. Nesse caminho, farmacêuticos forneciam benzina para alimentar o motor e sapateiros ajudavam a arrumar os freios (de couro). Richard e Eugen, os dois pimpolhos Benz, ajudavam mamãe a empurrar o carro ladeiras acima.
A viagem deu grande publicidade à firma do casal Benz e, a partir daí, vieram grandes aperfeiçoamentos nos freios e na caixa de câmbio.
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