quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

De Onde Veio o Apelido Vidinha


Protagonistas da série: Casal 20


Vidinha

   Algumas pessoas me perguntaram de onde tiramos a ideia de eu e Bere nos apelidarmos de Vidinha. Pois esta forma carinhosa de chamar-nos remonta já ao tempo de namoro. Só que nós solidificamos mesmo a forma de nos chamarmos assim no primeiro ano de casados. Na época rodava uma vez por semana um seriado na TV chamado Casal 20. Era protagonizado por Robert Wagner e Stefanie Powers. Ele, no seriado chamava-se Jonathan e ela Jennifer. Era um casal rico que gostava de viver uma aventura. E suas aventuras eram combatendo criminosos pelo mundo inteiro. Mas durante os capítulos do seriado, não faltavam aqueles momentos onde ele ou ela preparavam situações surpreendentes de carinho e amor, demonstrações de amor, fazendo o seriado ser mais doce e gostoso de ver. Muito aprendemos desta série. E muito do relacionamento deste casal nos identificou. Principalmente do quanto pode ser gostosa uma surpresa para mostrar o quanto é intenso o amor que se sente. O seridado escancarava isto de uma forma muito forte. A coisas aconteciam na telinha em ambientes glamurosos e nós imitávamos a ideia em nossa simples e pobrinha casinha de madeira. Pois o que importava não era o luxo que o seriado mostrava, mas as atitudes dos protagonistas. E, apesar de ricos, eles tinham atitudes simples, de amor, diferentes, que aconteciam em cada programa, no fim da aventura. E nós copiávamos. Eram os bilhetes apaixonados deixados sobre o travesseiro, uma flor no vaso solitário da cozinha, um abraço e um beijo enquanto Bere lavava a louça, um beijo roubado e um "Eu te amo" enquanto eu estava concentrado em alguma leitura, um bombom Amor Carioca trazido junto com o pão da padaria, eu ou ela entrar no banheiro depois do banho, pegar a toalha e enxugar o outro, pôr um disco a rodar e do nada tirar Bere para dançar, um dinheirinho alcançado por ela, tirado do seu salário e dizer: "Uma ajudinha para pagar a conta de luz deste mês!" - ...Tantas atitudes que engrandescem um relacionamento! ...Assim como esperar Bere na saída do serviço, na frente do escritório a duas quadras de casa, com um guarda-chuva porque chovia e ela havia esquecido de levar, voltando juntinhos e abraçados para casa em altos papos sobre o dia que havíamos passado. Ou, uma jantinha especial inusitada, com a coisa mais simples do mundo: pão com salsicha. Fazíamos uma maionese caseira porque na época era difícil encontrá-la industrializada, passada no pão e dentro colocadas 2 salsichas. Por cima das salsichas, corações desenhados com mostarda. Ou, esperar Bere voltar do trabalho com o chimarrão feito e a roupa que estava de molho no tanque (na época não tínhamos máquina), torcida, secando no varal. Ou, lá pelas onze da noite, inusitadamente no meio da semana, tirar uma espumante do congelador e fazer uma surpresa para comemorar o amor. Ela fez isto várias vezes comigo. Eu perguntava: "A troco de que, Vidinha?" - E ela respondia: "Vamos comemorar mais um mês sem discussão, mais uma semana de carinho e mais um dia de amor. Pra que deixar esta espumante guardada se temos tantos motivos para comemorar?"- Estas coisas simples, gratuitas, que só fazem bem e que repetimos tantas vezes. Copiamos também outras coisas do seriado. O sobrenome do ator Robert Wagner, virou o nome de nosso filho mais velho, Wagner. Eles tinham também uma cadelinha de estimação que chamava Freeway porque a haviam encontrada abandonada numa autoestrada. E nós arrumamos uma cadelinha também, a qual, lógico, foi batizada Freeway. E nossa Freeway era uma cadelinha meiga, doce, companheira. Raça pequinês, encantava todo mundo. Até que uma noite dessas alguém jogou um pedaço de carne com vidro moído no pátio, ela comeu e morreu. E neste seriado, Jennifer chamava carinhosamente Jonathan de Vida. Bere e eu achávamos tão doce este jeito de chamar. Afinal, Vida, é um termo intenso, ele condensa tudo em sua palavra. Gostamos tanto que assimilamos esta forma de chamar, nos chamando um ao outro também de Vida. Mas, com o passar do tempo, sentimos que chamar de Vida ainda não tinha a profundidade do carinho que sentíamos. Faltava adaptar o termo ao nosso relacionamento, para que soasse mais carinhoso. Então, um dia, Bere sem querer me chamou de "Vidinha". Nossa, lembro daquele momento como se fosse hoje.
   Era um sábado de tarde. Verão, calor, sol de rachar. Na divisa de nosso terreno com o do vizinho tinha uma cerca de estaquetas, que é formada por ripas de madeira. Tinha umas duas ou três quebradas pelo desgaste do tempo e eu resolvi consertar isso para impedir a passagem dos bichos da vizinhança. Estava eu lá, acocorado, suado de alto a baixo, chapéu largo, pregando uma estaqueta quando Bere chegou com um jarro e um copo e me chamou: "VIDINHA, fiz uma limonada para ti." - Encheu o copo com aquela bebida geladinha para mim, com cubinhos de gelo caindo junto no copo. Na hora aquela forma de me chamar me deixou desarmado. Fiquei tão impressionado pelo doce chamar de Bere, que fiquei em dúvida sobre o que mais me tocou: se foi porque ela me chamou de 'Vidinha', se foi a atitude dela em me fazer aquele agrado ou se foi a própria limonada. Acho que foi a soma das três coisas. Mas, aquele 'Vidinha' continuou soando em minha memória como se eu tivesse ouvido a mais bela e completa canção de amor de minha vida. Peguei o copo e enquanto comecei a tomar a trouxe para a sombra embaixo de um ingazeiro que tinha ali perto. Tomei aquela limonada em rápidos goles, estava sedento. Bere serviu o segundo copo e o repartimos. Meu olhar para ela foi de uma paixão tão intensa, que não me contive e disse: "Vidinha, Vidinha!!!!! Que maravilha! Nunca mais vou te chamar diferente. Vais ser minha Vidinha daqui pra frente!" - Ela tomou uns goles daquele copo, me alcançou ele pela metade e eu tomei o resto. Ficou só me olhando com seu jeito pós adolescente de menina-mulher, olhar atrevido e realizado, de quem havia selado naquele momento nosso relacionamento para sempre, só por dizer uma palavra. Ela encheu mais um copo, cubinhos de gelo caíram novamente tinindo junto com o suco, e enquanto ela voltou a tomar a limonada eu disse: "Nunca na vida ouvi um jeito tão doce de ser chamado. 'Vidinha'. De agora em diante vou te chamar assim: minha Vidinha!" - Ela começou a rir e respondeu: "Isto não vale, o apelido é meu. Sou eu quem vai te chamar de Vidinha." - Eu quis retrucar, mas ela falou antes: "Vamos nós nos chamar de Vidinha. Eu deixo. Saiu sem querer, mas eu também gostei muito. Muito mesmo! Soa tão gostoso!" - A partir daquele dia, até a partida dela, a maneira mais corriqueira de nos chamarmos foi Vidinha. Houve outros modos de chamar como 'amor', 'querida', 'paixão', 'tesouro', 'minha linda' 'esposinha' maridinho' e pelos nossos nomes. Mas, daquele dia em diante jamais passou um dia sequer, sem que ao menos eu ou ela nos chamássemos de "Vidinha".


A nossa cadelinha Freeway (1982)

A cerca de estaquetas que separava o terreno de nossa casa do terreno do vizinho (1982)


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