quinta-feira, 29 de maio de 2014

Hora da Faxina - Comida




 Comida

   A natureza foi pródiga conosco ao fazer com que tenhamos prazer em nos alimentar. Pois, sendo necessário ingerirmos diariamente esta mistura de elementos para mantermos nosso vigor físico e nossa saúde, nada melhor do que poder saborear e sentir o gosto dos mais variados alimentos.
   Muitas culturas diferentes criaram arranjos diferentes de comidas e comem coisas que para outras culturas possa parecer absurdo. Provavelmente, do mesmo jeito como nós nos impressionamos com os tipos de insetos que os chineses consomem, eles devem se impressionar com os tipos de raízes que consumimos, principalmente a mandioca, ou para os gaúchos, aipim.
   Fazer comida é um ato muito prazeroso para muitas pessoas. Outras já não gostam de cozinhar, exercendo a atividade unicamente para suprir as necessidades da família, já que de outro jeito, não comeriam. E comida feita só pela necessidade de fazer não é boa. Parece que falta algo em seu sabor, ou que não fecha no paladar. Geralmente o arroz é pegado, a carne é dura e o feijão é aguado e salgado. São as consequências de mãos lidando com as panelas com a obrigação diária de realizar esta tarefa. 
   Já comida feita com prazer tem sabor, tem alma, tem buquê. De uma simples cozedura de aipim se tira sua essência e parece que ele é mais gostoso. E explico por que: O aipim dá para cozinhar simplesmente atirando as raízes cortadas em pedaços em uma panela, encher a panela de água quente, jogar um punhado de sal e esperar amolecer em sua cozedura sem cuidar, afinal tem água suficiente para não secar. Este é o jeito prático de fazer esta raíz, que a deixará com falta de sabor. Outro jeito de fazer, quando se tem prazer em cozinhar, é jogar as raízes cortadas em uma panela, colocar água fria até cobrir, deixar em fogo médio até levantar fervura. Descartar esta água, colocar novamente água fria até cobrir, colocar uma colher de margarina, sal na medida e cozinhar em fogo médio, sempre acrescentando água quando as raízes começam a sair do líquido da panela. O sabor será bem outro porque desse jeito vai apurar o sabor do aipim, já que a quantidade de água é só o suficiente para cozinhar o aipim.
   Eu sou um desses cozinheiros que fazem comida por prazer. E além dos pratos tradicionais, tantos que faço, sempre ando inventando novos tipos e arranjos. Uma comida bem arranjada num prato já a faz ficar mais saborosa, afinal, se come primeiro com os olhos. Esta história de servir maionese em bacia plástica ou arroz em panela encardida já tira o gosto da essência do que estes recipientes contêm. As cores na combinação de comidas também sabem trazer um efeito especial na finalização de um prato. E na natureza é muito difícil existir alguma combinação de alimentos que seja prejudicial ao organismo. Tem vezes somente em que o sabor não dá uma boa mistura. Mas isto também é inerente ao paladar de quem vai comer. Coisas que eu gosto de misturar nem sempre serão coisas que você gostaria de misturar.
   Mas falando em pratos diferenciados, tem um que faço que é muito apreciado por todos que já o experimentaram, que é um molho especial que foi inventado por minha mãe. Por isto o apelidamos de molho da vovó Érica. Ela criou este prato devido à necessidade dos tempos bicudos da familia, onde a grana escasseava e tinha que fazer malabarismos para chegar até o fim do mês com o salário que meu pai ganhava. Como a turma era grande, e aumentava nos domingos já que levávamos namoradas para casa, o almoço tinha que render com algum tipo de carne barata. A eleita foi o cochão duro. E dali acabou saindo uma receita única, que leva quatro horas para preparar, e que a mãe iniciava nos domingos às 8 da manhã para servir ao meio-dia. Não tem segredo. O jeito de fazer é que faz a diferença. Eu aprendi a fazer este molho com a mãe, e sempre sou solicitado pelos irmãos e sobrinhos para o fazer em encontros nossos. Aliás, aprendi a fazer tão bem, que um dia meu pai deixou a mãe muito chateada pois disse que eu fazia o molho dela melhor do que ela. E eu também, em vez de me orgulhar do que ele disse fiquei chateado pela mãe, por meu pai ter sido tão indelicado com ela. Eu tinha na época doze anos.
   Sempre fiz este molho. Prato garantido pelo menos uma vez por mês. Bere adorava e sempre pedia para fazer. Então, num domingo desses eu fiz este molho. Ainda não tínhamos filhos. Fiz a mais para sobrar para segunda feira.  Ocorre que na segunda, veio um velhinho limpar meu pátio. Eu o havia contratado para fazer este serviço, por pena dele, já que era aposentado, ganhava pouco e tinha uma família enorme pendurada em seus proventos. Assim ele tirava um extra. Zé era o nome dele. Como ele não havia concluído o serviço de manhã, o convidei para almoçar conosco. Comida simples: o molho da vovó Érica, arroz e salada de repolho e alface.
   Zé prontamente aceitou meu convite. Sentou conosco à mesa, eu e Bere de um lado e ele do outro lado. De cara pediu uma colher para comer, que ele não sabia comer com garfo. Bere alcançou uma colher para ele, e o velhinho serviu um monte de arroz e cobriu aquilo de molho. Se deliciou tanto, que repôs seu prato agora só com o molho. e ele, comendo de colher repetia a toda hora:
   - Mas que gostoso este feijão. Dá pra comer puro! Eu nunca em minha vida comi um feijão tão gostoso.

Preparando o famoso molho para a família. Na companhia, a sobrinha Francine.

2 comentários:

  1. Respostas
    1. Amaaaaaada, sabes que muito do gosto da comida que faço vem do amor que vocês me dão.

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