Música
Hoje me deu vontade de ouvir novamente o CD do cantor Lobo que Bere tanto amava. Não havia mais ouvido desde a sua partida. Claro, porque as canções deste CD me lembram muito ela. Mas, como o assunto entrou em cena em minha descrição anterior, me deu vontade de ouvir. Não o fiz antes, porque eu certamente choraria durante todo o tocar do disco. Mas consegui ouvir todo ele enquanto preparava o almoço. Somente chorei quando Lobo cantou: It Sure took a long, long time - É certo, tomou muito, muito tempo. - Não tem com não se emocionar. Ele diz na canção: A magia que tivemos juntos, parece muito mais forte do que antes, o que aprendi para recompor nosso amor, garota, tenho que reaprender, e isto é certo, tomou muito, muito tempo. - E eu tive que reaprender a conviver com toda a diferença que o mundo nos apresentou. Acho que por isso eu chorei. E ouvi de novo a canção. Cantei junto chorando. E ouvi uma terceira vez. E chorei mais uma vez. Emoção à flor da pele, mas das boas, que depuram. Nas incertezas da verdade que se instalou me fez, apesar de ser uma pessoa participativa, reaprender a vida. A situação me cobrou isso. Reaprendi a ser mais dócil, mais parceiro, mais gente, mais humilde, saber dizer "muito obrigado" em todos os momentos, tirar mais tempo para Bere, enfim, a me dedicar a ela. Aliás, Bere tinha o costume de sempre dizer "Muito obrigado!" - por qualquer motivo. E parece que esta canção foi escrita para nós dois. Pois fala de reaprender. Quantas pessoas passam uma vida inteira com suas certezas, tomando-as como máximas, e machucando pessoas. Quantas? Conheço muitas. E como na canção do Lobo, que Bere adorava acompanhar, a vida ensinou a fazer de mim um responsável sem limites, para que ela tivesse neste desenrolar de incertezas pelo menos a certeza de mim presente e solidário em todos os momentos. Ainda ouço na vozinha dela cantando junto o final do refrão: "Took a long, long time" - Tomou muito, muito tempo. E cantava desafinada. Mas, mesmo assim, eu amava. Porque o coração dela cantava, não importava a forma como se expressava. No desafino de sua voz, estava a beleza de sua dedicação em compartilhar comigo o doce gosto de belas canções. Ela olhava para mim com um brilho sem igual no seu negro olhar, e cantava. Tudo fora do tom. Mas não tinha vergonha de cantar. Porque sentia que eu via em sua expressão de doçura e alegria, aquele momento ser único, merecido, e que o desafino somente era um detalhe.
Apesar de que ouvir este CD ter me feito bem, como se diz, lavou minha alma, ele também me deixou choroso. Vou guardá-lo e ouví-lo quem sabe, daqui a uns meses quando meu coração o pedir. Porque meu almoço não foi o melhor, apesar da comida maravilhosa que fiz com todo o carinho para mim e os filhos. E depois, estendendo nossas roupas nos cabideiros para por no sol para secar, a canção voltou plena em meus pensamentos e eu chorei o tempo todo enquanto colocava nossas camisetas nos cabideiros. Lembrando do carinho que Bere dedicava a esta atividade, de colocar nossas roupas exatamente do jeito como eu estava fazendo, cantarolando, nas tardes de domingo, fora do tom, mas com o coração. Foi mais forte do que eu. Senti uma sensibilidade tão angustiante me tomando, e a melodia correndo no fundo, que não resisti. Eu só pensava: "It tooks not a long, long time, but a short, short time - não tomou um tempo longo, longo, mas sim, um curto, curto tempo."
O guarda-sol que tradicionalmente armava defronte à piscina nesta época do ano, onde numa tarde como a de hoje, colocava uma melancia gelada e partia para Bere comer, enquanto eu abria uma cerveja, ficou no seu lugar, em cima do guarda-roupas. Não quero abrir ele e trazer mais lembranças das que foram do verão passado. Bere ainda está muito presente em mim, e estas cenas, apesar de lindas, convividas com ternura e paixão, vão acabar me fazendo chorar. E hoje eu já chorei demais. Ardem os olhos. Então deixa lá o guarda-sol, a mesinha de pvc, a cadeira de praia. Quem sabe, no verão que vem, tiro do seu lugar e recoloco no pátio e relembro dos lindos verões que passamos juntos.
Aqui o flagrante de Bere comprando o CD numa lojinha em Arroio do Sal, durante nosso veraneio ei 2009
Capa do CD
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