quinta-feira, 17 de julho de 2014

Hora da Faxina - Dois Cruzeiros



 Dois Cruzeiros

   Quantos adultos de nossos tempos, anos cinquenta, sessenta, setenta, trabalhou desde criança? Tenho certeza que a maioria vai dizer que sim, que desempenhou alguma atividade, mesmo que não remunerada, quando criança. E se perguntar se achou que estava sendo escravizado por causa disso, certamente todos responderão que não, que a situação assim o exigia. Família grande, sem condições de pagar por serviços que se avolumavam diariamente no meio familiar, obrigava os pais a botarem os filhos no batente.
   Muitas vezes até existia algum pagamento quase simbólico quando se fazia trabalhos para vizinhos. Eu me lembro que era bem criança quando um dia ajudei a carregar lenha para fogão a lenha para dentro, na casa de uma vizinha. Era uma pilha enorme e trabalhamos quase um sábado inteiro pois era para ser guardada arrumadinha e empilhada no porão daquela casa que era alto. No fim do trabalho, recebi uma nota de 2 Cruzeiros, laranja de um lado e azul do outro. 
   Fiquei muito faceiro pois foi o primeiro pagamento que havia recebido em minha vida por um trabalho realizado. E minha tristeza ao chegar em casa e ouvir a mãe dizendo que era para eu guardar aquele dinheiro dentro de minha lata junto com as moedas que eventualmente recebia, para no fim do ano comprar alguma coisa. 
   E neste meio tempo, não lembro direito, houve troca de estampa no dinheiro, algo assim, e minha mãe nem eu lembramos que tinha que tirar aquela nota para trocar por uma nova, porque senão perderia o valor. E foi o que aconteceu. Quando no fim do ano abri a lata para somar as economias, vi a nota que agora não tinha mais valor. Chorei muito, lembro bem, porque foi trabalhoso conquistar aquela grana. Em compensação, guardei a nota e a tenho guardada comigo até hoje.
   Depois, quando nossos filhos chegaram aos dez anos de idade, cada um teve seu dia de trabalho estabelescido, no caso sábados, para ganharem mesada. Uma forma de dar dinheiro a eles responsavelmente, para eles valorizarem o que ganhavam de nós. fosse varrer o pátio, ajudar a cortar a grama, lavar a louça, comprar alguma coisa no supermercado pertinho de casa, varrer a garagem e assim por diante. Todos trabalhinhos não cansativos mas educativos. No fim do dia, o dinheirinho pelo trabalho feito. E a recomendação: "Podem usar seu dinheiro da forma que desejarem. Só tem um detalhe: em nossas férias na praia, o picolé na beira do mar vai sair da mesada que recebem. Portanto, poupem ao menos o suficiente para não ficarem sem picolés nas férias."
   Pois isso funcionou tão bem, que eles aprenderam a poupar, juntar seu dinheirinho para comprarem coisas para eles. Primeiro juntavam para irmos perto do dia das crianças em São Leopoldo, onde tinha uma loja grande da Lego, para comprarem o kit que desejavam para montar. Mas faziam as contas para sobrar para o picolé. E eles cresceram assim, aprendendo a administrar seu próprio dinheiro. Fácil assim.

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