terça-feira, 31 de dezembro de 2013

2014: Recomeçar




Recomeçar

  Recomeçar. Esta é a palavra. Em sua essência existe algo de ansiedade, pois o incerto de um recomeço causa muitas espectativas. Por outro lado, os recomeços de nossas vidas são realmente quem fazem os movimentos dela. Sem eles, o marasmo dos dias iguais acaba por deixá-la sem graça. Insossa. Por isso a importância de recomeçar. Mesmo eu me sentindo ainda completamente despreparado para grandes atitudes, a vida merece um recomeço. Fazendo novas amizades, tocando projetos que andam engavetados, melhorando nosso cantinho, o deixando no aconchego que sempre foi. A garagem e o quarto do Guilherme precisam de uma repintura. Faz algum tempo que Bere havia me falado sobre isto. Até a tinta já foi comprada. Mas com o correr do ano que passou, com tantos sobressaltos, nem lembrávamos mais deste projeto. Por incrível que pareça, quem reascendeu o debate sobre isto foi nossa passadeira de roupas, a Andréia. Ela prefere passar roupas na garagem porque lá é mais fresquinho, sempre corre uma brisa, e hoje quando fiz o chimarrão e parei com ela pra conversar, ela olhou ao redor e disse: "Pio, isto aqui precisa de uma pintura! Não é que está feio, mas ficaria mais bonito." - Então, tudo voltou em minha mente. E eu respondi dizendo que fôra projeto nosso para 2013 repintar estas duas peças da casa. Assim como fôra projeto também melhorar a saúde bucal de Bere, que vinha com mobilidade dentária devido à quimioterapia. Da metade do tratamento em diante, a comida tinha que ser facilmente mastigável devido ao seu problema. E tínhamos nos proposto a que ela refizesse toda a sua arcada dentária quando o tratamento tivesse terminado.
   Bere ficava chateada por não poder mais morder as frutas e delas arrancar nacos com os dentes. Tudo tinha que ser picado em pedaços. Ela me via mordendo uma maçã com vontade e ficava no desejo de poder dar uma mordida assim também. Então, um dia, na merenda da tarde, durante o inverno, ela estava sentada no sol porque a quimioterapia faz sentir muito mais frio. Eu fui, peguei uma maçã bem vermelha, lavei e fui comendo, enquanto ia para junto dela, fazer companhia e conversar. Ela olhou para mim mordendo aquela maçã com gosto, tadinha, ela comendo a sua picadinha num prato, e disse: "Que vontade de fazer isso! Que saudades de uma mordida assim na maçã! Comer uma maçã do jeito como eu estou comendo não tem a mesma graça!" - Eu ri e disse: "Vidinha, não vejo diferença nenhuma em comer a maçã direto, ou picadinha no prato." - Bere ficou me olhando enquanto pensava. De repente, falou: "Morde e me dá esse pedaço?" - Prontamente eu mordi, tirei um naco, e este pedaço tirei da minha boca e pus em sua boca. Ela começou a mastigar, saboreando, como se fosse a primeira maçã de sua vida. Nossa, o encantamento dela era tão grande, que chegou a fechar os olhos para sentir o  sabor deste pedaço de maçã em toda a sua essência. Parecia uma criança comendo seu primeiro chocolate. Até cheguei a pensar que ela estava fazendo aquilo só para me bobear, porque, afinal, o que tem de diferente entre uma maçã picada e uma maçã mordida aos pedaços? Mas a resposta veio em seguida, do jeito único, reparador e detalhista que Bere tinha com tudo o que compunha a sua vida. Então ela falou: "É outro sabor e sei por que!" - Eu ainda ri e retruquei: "Claro, tem a minha saliva aí junto." - Mas, Bere séria, enquanto engulia, disse: "Assim a maçã encaixa na boca, não é como os pedaços quadrados dela picada, que ficam machucando o céu da boca e a gengiva! O pedaço mordido é anatômico, encaixa na boca sem agredir." - Fiquei admirado diante da conclusão de Bere, afinal, fazia sentido. Eu ri e disse: "Sabe que tens razão?" - A partir daquele dia, sempre quando eu ia comer uma maçã, a primeira mordida dava para ela. E eu saboreava ver ela mordendo este pedaço, com a mesma carinha premiada de sempre.
  Recomeçar. Minha estrutura vai ter que se basear nisto em 2014. Tocar a vida num eterno recomeço, de coisas boas e produtivas. Focado nos meus dois meninos, focado no meu trabalho e focado na manutenção de tantas amizades que precisam ser regadas como plantinhas. Para que durem. Porque os amigos são a base de sustento de todas as nossas vicissitudes. E olhar profundamente para a família. A minha, com certeza, que é foolgas e que quando se encontra faz toda a vizinhança saber do encontro porque todos falamos alto. E a da Bere também, que é minha família do coração, e que jamais irei mudar, tome minha vida o rumo que for, porque amo esta família! Ela é feita de pessoas tão doces como Bere era. Claro que cada cunhada, cunhado, sobrinhos com seu modo particular de ser. Mas a essência da doçura que veio de berço todos têm, e isto me faz admirá-los tanto quanto admirava Bere. Enfim, uma grande família, que eu adoro. Que venha 2014!


Bere dançando Macarena enquanto os risólis da ceia de Ano Novo aqueciam no forno.


 Dia do Ano Novo na praia de Arroio do Sal, Bere esperando o churrasco ficar pronto enquanto tomava chimarrão.

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